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Revista Mercado Automotivo (São Paulo/SP) Brasil: um novo polo tecnológico

Brasil: um novo polo tecnológico

Fonte: Revista Mercado Automotivo

Há menos de 20 anos o Brasil não era conhecido por sua expertise tecnológica. Os sistemistas produziam apenas as peças necessárias para os veículos à venda. Já as montadoras tinham todos os seus projetos desenvolvidos no exterior e trazidos para o Pais para começar a produção. Poucas empresas arriscavam desenvolver produtos inovadores. "A indústria automobilística brasileira mudou muito nos últimos dez anos. Hoje, quase todas as multinacionais têm centros tecnológicos instalados aqui, onde desenvolvem produtos não só para o mercado

interno como exportam também", explica Amaury Oliveira, gerente de Engenharia, Gerenciamento de Programas e Qualidade da Delphi Soluções em Produtos e Serviços para América do Sul.

Para muitos especialistas do setor automotivo é possível afirmar que essa revolução na maneira de criar projetos representa uma terceira "onda" dos mercados do Brasil. "A primeira aconteceu em 1950 com a vinda das montadoras. Em 1990 foi a vez da segunda, com a abertura do País para a exportação. Agora, passamos pela terceira onda, na

qual nos tornamos uma grande potência nesse segmento", disse lurgen Ziegler, presidente e CEO da Mercedes-Benz do Brasil, no último Congresso da SAE, que aconteceu em outubro passado.

Mesmo com o Brasil se tornando um polo de tecnologia, ainda é preciso que muita coisa mude para que esse crescimento seja sustentado, principalmente no que diz respeito à formação de novos profissionais de engenharia. "O engenheiro que o País necessita hoje precisa saber um pouco de tudo e não ter limite para sua atuação. Por esse motivo, suas

características básicas precisam contemplar: conhecimento, habilidade e atitude", explica Gilberto Gomes Leal, gerente de Desenvolvimento de Motores Leves da Mercedes-Benz.

Para Leal, o engenheiro do Brasil tecnológico precisa entender que não se leva mais 10 anos para se desenvolver um projeto e, sim, um ano. "Hoje temos uma revolução tecnológica por dia e é preciso estar atento a isso", afirma. O gerente de Desenvolvimento, que tem mais de 30 anos na montadora de origem alemã, também diz que o novo profissional precisa saber agir mais rapidamente. "Ele necessita aprender a mobilizar recursos (criar sinergias), ter boa comunicação, se atualizar constantemente, estar engajado e, principalmente, comprometido."

E essas competências citadas por Leal são necessárias em toda a indústria automobilística. Na Fiat, segundo José Guilherme Silva, gerente sênior da Fiat Automóveis, os engenheiros são preparados para desenvolver um projeto desde seu início até o pós-venda. "Até 1996, a Fiat do Brasil dependia da Itália para seus projetos. Atualmente temos uma equipe bem preparada que em 2009 apresentou 93 projetos de novos veículos", afirma. Silva explica que antes da década de 90, a engenharia brasileira era passiva e muito mais corretiva e hoje pode ser considerada uma das mais inovadoras do mundo. Além disso, o gerente destaca que a engenharia brasileira está preparada para atender localmente, o que significa que ela está adequada para o global.

Situação parecida aconteceu com a General Motors, que passou de uma engenharia passiva para inovadora. Segundo Alberto Rejaman,

diretor executivo da GM, apenas em 1996 a engenharia brasileira da montadora passou a desenvolver alguns derivativos, mas hoje ela está preparada para criar plataformas globais em conjunto com os Estados Unidos e a Europa.

Para que isso acontecesse, Rejaman diz que os engenheiros da companhia precisaram mudar seus perfis. "É preciso saber outros idiomas e ter um pensamento global."

INFORMATIZAÇÃO NECESSÁRIA

Para que o grande salto da engenharia automotiva brasileira acontecesse foi preciso primeiro uma revolução em programas e na informatização dos processos. Para o gerente de Desenvolvimento de Produtos e Marketing da Mann+Hummel, Raul Cavalaro, o avanço nos programas e softwares trouxeram muita agilidade. "Atualmente um projeto que demorava mais de um ano para ficar pronto, pode ser finalizado em poucos meses graças à tecnologia. Hoje, por exemplo, é possível fazer protótipos por meio de programas

virtuais e testar sua eficiência sem margem de erro", explica.

O gerente Amaury Oliveira, da Delphi, concorda. "Para que nossa engenharia mudasse nesses últimos dez anos e se tornasse mais competitiva foi preciso uma grande mudança, principalmente no que se refere à informatização dos processos. Um dos maiores exemplos são as simulações virtuais, que facilitam e diminuem os custos do projeto", completa.

MOTORES FLEX, DECISIVOS PARA O BRASIL

Segundo Amaury Oliveira, a mudança de importador para exportador de tecnologia aconteceu mesmo quando foram desenvolvidos os primeiros motores movidos a álcool e a gasolina. "Até hoje a engenharia brasileira é a mais especializada e desenvolve peças exclusivas para motores movidos a álcool", diz.

Para Ricardo Namie, diretor da Assistência Técnica da NGK, o motor movido por dois combustíveis ajudou a mudar até mesmo a en-

genharia de velas que não recebia inovações tão grandiosas desde sua criação. "Esse tipo de motor aquece muito mais, o que necessita de uma vela que faça maior troca de temperatura, além de outros detalhes que precisaram ser adaptados." O diretor ainda conta que toda essa mudança foi feita exclusivamente pela engenharia brasileira. "A NGK está no Brasil desde 1959 e foi um dos primeiros sistemistas japoneses a ter um centro tecnológico fora da matriz. Mas, desde aquela época, um projeto como o das velas para os motores flex não fazia tanto sucesso", conclui.

CENTROS TECNOLÓGICOS E SEUS PROJETOS

Atualmente 90% das sistemistas têm centros tecnológicos de desenvolvimento de novos projetos no Brasil. A Mann+Hummel, por exemplo, tem um em Indaiatuba, São Paulo, no qual desenvolve produtos para o mercado brasileiro e também para exportação. "Existem algumas características do mercado nacional que necessitam de produtos especiais, como o segmento de pesados, por exemplo", diz Cavalaro.

O gerente conta que o filtro de ar da linha pesada oferecido pela Mann+Hummel foi desenvolvido pela engenharia brasileira da sistemista, focando as condições das estradas daqui. "O nosso produto possui um "ciclonizador" de ar que garante que mais de 80% do contaminante aspirado não se acumule no elemento filtrante e, sim, nas paredes internas e no fundo da carcaça, sendo descartadas posteriormente sem causar entupimentos. Essa inovação, disponível para o aftermarket e adotada por algumas montadoras,

pode ser considerada um marco no segmento", completa.

Já a Delphi conta com três grandes centros tecnológicos no País: em Piracicaba e São Caetano do Sul, ambos em São Paulo, e outro em Paraisópolis, em Minas Gerais. "Alguns de nossos projetos já foram premiados e exportados para outros países. "Um dos exemplos é a Mapec novo conceito de central elétrica que substitui uma série de equipamentos mecânicos por sistema de eletrônica embarcada em veículos de entrada, eliminando, assim, fusíveis, relês e módulos eletrônicos. Esse produto é exportado para a índia", conta Oliveira.

Ainda segundo Oliveira, a Delphi mantém em seu Centro Tecnológico no País os equipamentos mais modernos para testes, além de ter um laboratório certificado pelo Inmetro: "Isso nos permite não só confirmar a qualidade de nossos produtos como também oferecer esse serviço para outras empresas".

A Monroe Axios Tenneco desde 2005 tem um Centro Tecnológico no

Brasil. "Atualmente temos 11 engenheiros, entre mestres e doutores, focados em proporcionar inovações", conta Narciso Ichano lúnior, supervisor do Laboratório de Ensaios e Desenvolvimento da empresa.

lúnior afirma que os projetos de inovações criados no Brasil aumentaram tanto que o Centro Tecnológico Brasileiro da empresa foi convocado recentemente para trabalhar diretamente com a cúpula global de criação da marca, composto por países como Bélgica, Espanha, Polônia, entre outros. "Ainda não temos nenhum produto no mercado, mas já existe muita coisa sendo estudada para chegar ao aftermarket e até mesmo montadoras", diz.

A Cofap, do grupo Magneti Marelli, tem uma longa história com o desenvolvimento de produtos. De acordo com Luis Bolem, gerente de Pesquisa e Desenvolvimento de Amortecedores, desde que foi fundada, em 1951, a empresa já contava com um centro de inovação tecnológica: "Antes de a empresa ser comprada pelo grupo italiano

ela já exportava seus produtos desenvolvidos no Brasil para mais de 100 países. Depois da aquisição foi decidido não só manter o centro como trabalhar com a expertise que os engenheiros daqui têm sobre amortecedor".

A engenharia de desenvolvimento de amortecedores da Magneti Marelli fica em Mauá, São Paulo, mas a empresa tem também centros móveis para participar de testes em outras localidades. "Em nosso laboratório temos testes de durabilidade, baixa temperatura, entre outros, além de quase uma fábrica de protótipos e uma pista de rodagem", afirma Bolem. Ainda de acordo com o gerente, o Brasil mantém uma grande troca de informações com Detroit, nos EUA, e Turin, na Itália. Isso para

que se adequem os projetos e se criem novas tecnologias.

MUDANÇA DE CULTURA

A necessidade de se investir mais em educação é um ponto comum no País e os profissionais das empresas do setor automotivo não pensam diferente. Alguns acreditam, inclusive, que seja necessário que o próprio setor privado, junto com o governo, deva fazer mais pelas escolas e universidades. "É preciso que as empresas invistam nas universidades e em programas de mestrados e doutorados para seus contratados. Só assim vamos deixar de ter apenas engenheiros de aplicação para criarmos engenheiros de inovação", finaliza Júnior, da Monroe.

Mas de nada adianta mudar as fábricas, criar novos centros e formar mais profissionais se a cultura de registrar os produtos e tecnologias não mudar. Segundo Amaury Oliveira, gerente da Delphi, para que o País seja reconhecido mundialmente como um polo tecnológico estabelecido é preciso mudar um pouco a cultura da engenharia brasileira, principalmente no que diz respeito ao registro de patentes: "Nos Estados Unidos isso é levado muito a sério e quase todas as idéias são patenteadas. lá no Brasil isso ainda é raro", conta. Pata mudar esse quadro, o executivo explica que em sua empresa eles estão ctiando incentivos para que os engenheiros divulguem mais suas idéias. "Mas esta não é uma tarefa fácil", admite.